terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

46 – Um inocente passeio ao anoitecer

Não sou adivinho, nem profeta, mas neste caso qualquer um conseguiria fazer um vaticínio acertado. Depois do lauto lanche fomos dar uma volta. A Clarissa desde que chegara, fazia no domingo oito dias, só conhecera a Main e o trajecto até à casa do dr. Capuchinho. A casa era grande, a biblioteca recheada e o jardim nas traseiras bastante acolhedor, nestes dias outonais de Verão de São Martinho. A tia passava o tempo todo no seu quarto, só dando ares da sua desgraça (implicação minha, está claro, já que a senhora é uma santa) nas refeições.

Por isso resolvemos dar um passeio pelos poucos quarteirões do bairro dormitório da cidade. Na pratica este bairro começa logo nas traseiras da Main, mas não faz mal. Levámos a visita a conhecer a casa do avô, pelo menos por fora. O edifício, com primeiro andar de três grandes janelas para a frente, é mais pequeno que o do Dr. Capuchinho. Como grande parte das casas silveirenses é de madeira, america’s style. Está em reparações e de momento as tábuas do exterior aguardam uma coloração amarelo canário, como tinha sido vontade do dono em vida. O jardim está bem tratado. Relva recém cortada, sebes laterais aparadas, nas traseiras canteiros de rosas viçosos e árvores regadas. A entrada para a garagem estava tapada por um contentor de entulhos e estragava o cenário.

Da casa do Dr. Capuchinho àquela a distância era somente a de uma casa. E essa era a habitação para onde recentemente se mudara a poderosa Natércia Brigadeiro. Originalmente esta casa pertencera ao arquitecto americano que ajudara o Sr. Teotónio no projecto e construção desta cidade. Francis Montgomery prolongou a sua estadia na cidade por vinte e cinco anos, mas sentindo a morte a chegar partiu para a sua pátria. Recentemente a Natércia após mover mundos e fundos lá conseguiu o seu lugar na zona nobre do bairro.

Como curiosidade informativa a Natércia é casada com o Mayor, Albano Brigadeiro. Vivendo antes de ocupar do cargo perto do início da rua, de seu nome Teotónio da Silva, bem perto da casa do senhor Peninha (patrão da minha mãe e da mãe do Mike).
Na Teotónio da Silva Street, o visado não quisera ter o seu nome ligada a uma avenida, o movimento àquela hora (e acrescento, a toda a hora) era fraco. Assim que saímos da zona mais elitista do bairro deixámos de passar incógnitos. Várias pessoas correram ao passeio para verem melhor a herdeira e ameaça da cidade. Como seria de esperar numa sociedade americana várias dessas pessoas estavam a tratar do jardim ou a chegar do trabalho ou a sair para um drink before dinner.

Anoitecera por completo. À medida que penetrávamos na Main em direcção do Point mais gente parava o que estava a fazer para observar a Clarissa. Assumimos uma formação de protecção. Eu seguia à frente, qual ponta de lança, a Clarissa vinha atrás de mim ladeada pela Joana e a Vanessa. Os rapazes protegiam a retaguarda. Abrimos caminho mostrando a visita, mas dificultando a abordagem. Com tanta gente especada e aglomerando-se à nossa volta o Xerife e alguns delegados vieram repor a ordem, não que estivesse a haver alguma desordem, mas no prevenir está o ganho.

Fomos forçados a fazer uma paragem estratégica na Grand Groceries do meu pai. O Xerife preferiu esta solução para poder dispersar a pequena multidão silveirense. Levei na cabeça pelo meu pai por termos exposto a pobre rapariga. O mesmo disse o Xerife e um dos delegados, Zé Crispim o mais velho na função e na idade em funções, também começou a falar, mas foi travado pelo chefe. Onde já se viu o delegado passar sermões quando o xerife tinha acabado de o fazer? Para castigo teve que furar a multidão e ir buscar uma viatura para levar a Clarissa de volta à casa onde estava hospedada.

1 comentário:

  1. Coitada, então a rapariga não pode nem dar uma volta para desgastar as calorias das bolachas e dos bolos?

    Entretanto, não acho que a herdeira tenha qualquer tipo de ideia, controlada, como é, pela tia. Teremos que esperar pelas intenções da tia.

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