sexta-feira, 3 de junho de 2011

75 – O Mike e os meus pensamentos

Durante algum tempo, que me pareceu muito, mas deve ter sido mais ou menos meio minuto, ficámos eu e o Mike em silêncio naquela luxuosa sala de estar. De repente o luxo deixou de atrair. A temperatura terá caído em segundos? Éramos dois seres estranhos ao cenário. Retratos, lareira, candelabro, sofás e restante mobiliário, o fofo tapete, reposteiros e a pouca luz por eles coada. Um casaco por ali abandonado, levemente familiar, dava um toque de melancolia a mais ao nosso estado de espírito.

Como se o tempo tivesse voltado ao fluir normal, a voz do Mike soou-me demasiado alta.

- Meu, vou atrás dela.

Segui-o. O que fazer? Ficar? Para quê? O ambiente estava péssimo e a Clarissa talvez não apreciasse muito a minha companhia. Mais, o meu lugar é com os meus amigos que estejam com problemas. A Vanessa precisava de todos nós. E... afinal o que a Clarissa foi fazer lá a cima? Ah, sim, foi ver o papel da análise genética.

As passadas do Mike eram largas. Como levei algum tempo a atingir o ritmo dele, deu para reparar em como ia tenso. Os meus pensamentos ocupavam-se com outra pessoa. A Clarissa. Como me situar perante o facto de ela ter feito a análise e não nos ter contado nada? Teria obrigação? Estávamos a construir uma amizade, se nos tivesse contado mudaria alguma coisa? E agora? Tantas perguntas, mas nenhuma resposta em parte porque o Mike virou-se para mim e perguntou:

- Beto, o que é que acabou de acontecer? – Ele parou e ficou a olhar para mim. Deu-me vontade de rir. Apoiava-se na perna esquerda, a outra ligeiramente adiantada. Mãos nas ancas. Rosto preocupado. – Juro-te que não entendo as mulheres.

Ora aí está uma revelação bombástica: o grande Mike não entende as mulheres!

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